Psicologia no Trânsito
Caros Leitores. Dando continuidade às 27 disciplinas que fazem parte do Curso Superior de Segurança no Trânsito, nesta décima publicação farei um resumo da Psicologia no Trânsito. Uma disciplina muito interessante por abordar exatamente uma das questões das mais complexas que é o comportamento humano no trânsito.
De uma forma didática e com o emprego de uma compreensão de leitura por quem não possui o domínio em psicologia, o curso possibilita ao aluno entender um pouco mais os seres humanos, suas motivações, algumas causas e como isso tudo é visto pelas autoridades.
Considerações iniciais
É de conhecimento amplo que os problemas decorrentes dos acidentes de trânsito têm alcançado patamares altamente elevados e trágicos. A incidência maior de vítimas está na faixa dos 35 anos e do sexo masculino. Historicamente o país não tratava dessas questões como deveria, gerando assim um abuso da população pela presunção da invisibilidade ou impunidade.
Entender a complexidade do trânsito é mergulhar profundamente em diversos aspectos socioculturais e dentre eles, a psicologia. É entendendo as ações e reações de uma parcela na sociedade capaz de agirem ilegalmente, colocando as vidas de terceiros em altos riscos de óbitos e ferimentos graves, além deles próprios, que o Poder Público alternou sua passividade para uma atuação mais efetiva e enfocando sobre os mecanismos que pudessem separar quem é quem no meio de tantos condutores que possuem o Direito de Dirigir.
Divisão dos Estudos
1 - Psicologia no Trânsito e as conexões com outras disciplinas
2 - O comportamento humano no trânsito
3 - Fatores humanos e tendências aos acidentes
4 - Mobilidade das pessoas
1 - Psicologia no Trânsito e as conexões com outras disciplinas
A Psicologia possui estreita relação com a Medicina de Tráfego e com o Direito. As relações não são muito bem definidas e tomam formas empíricas, mais exatamente pelos aspectos Legislativos os quais determinam a inserção de procedimentos preventivos através da psicologia para obtenção de laudos de sanidade e capacidade de um candidato ou mesmo já habilitado corresponder às ações comportamentais adequadas às necessidades de compartilhamento social através da mobilidade ao dirigir veículos.
Ao contrário do que se imagina, os testes psicológicos para motoristas no Brasil datam desde os anos de 1920 como condição preliminar para obtenção de licença ou emprego no transporte e mobilidade.
O cumprimento das regras de trânsito exige dos condutores um perfil psicológico equilibrado de modo a não se corromper em desrespeito por motivações das mais diversas, tais como desavenças familiares, desentendimentos profissionais, crises pessoais, entre outras.
Na psicologia são estudadas as causas que levam um ser humano ao desrespeito, não apenas às Leis de Trânsito, mas às muitas Leis que fazem parte do regramento social, entre elas a própria CF Constituição Federal. De fato essa tarefa requer amplos conhecimentos da psique e é restrita a quem realmente possui elevados conhecimentos psicológicos através de anos de estudos e pesquisas.
O Trânsito é um complexo de situações nas quais são necessárias muitas adequações em nome da própria fluidez harmônica e pacífica, além do cumprimento das regras que previnem acidentes e vítimas. Com as transgressões de um só indivíduo, é possível que causem transtornos imensos aos demais à sua volta.
Uma grande autoridade na Psicologia no Trânsito foi Rozestraten, psiquiatra renomado que estudou as ligações das pressões sociais com os resultados indesejados em comportamentos advindos de trabalho árduo, busca por emoções, inferioridade econômica ou social, responsabilidades excessivas, relações íntimas etc. Nesse contexto forma-se uma somatória de causas que levam um indivíduo despreparado a colocar em risco a si e aos outros no convívio do trânsito.
Somente num passado recente a importância de uma avaliação psicológica por perícia especializada passou a ser incorporada nas ações do Poder Público para orientar procedimentos de reciclagens e no extremo dos resultados, a suspensão ou cassação do direito de dirigir de uma pessoa. Até então a psicologia era restrita às avaliações através de laudos psicotécnicos para candidatos a obtenção da CNH ou na sua renovação, mudança de categoria etc.
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Aplicação da Avaliação Psicológica conforme o CTB
Art. 147 - Para obtenção da CNH
Art. 147 - Na renovação periódica se exerce atividade remunerada
Art. 268 - Adicional aos cursos de reciclagens em casos de acidentes, envolvimento em altos riscos ou condenado judicialmente por delito de trânsito.
2 - O Comportamento Humano no Trânsito
Trânsito por excelência significam além das definições previstas no CTB Código Brasileiro de Trânsito, as prerrogativas explícitas na CF Constituição Federal, em especial sobre o Direito de Ir e Vir.
Por vivermos uma sociedade desigual, com atitudes desumanas, egoísta, poucos valores éticos e morais, desrespeito aos próximos e pouca solidariedade o trânsito mostra-se como uma arena de disputas violentas a céu aberto.
As diferenças pelos padrões de poder, financeiro, hierárquico e sociais surgem como divisores das camadas que a rigor deveriam exemplificar a harmonia e convivência pacífica, mais ainda pela gama dos privilegiados com um índice cultural acrescido de formações educacionais superiores.
Se aprofundarmos nas motivações que levam os seres humanos à esses comportamentos tão agressivos, injustos e desumanos a psicologia pesquisará uma linha histórica desde as primeiras informações da humanidade e há milhares de anos AC. O Trânsito mostra-se apenas uma das inúmeras formas de discórdias.
Na minha visão, não acadêmica, entendo o Trânsito como se fosse uma variante das muitas categorias de artes marciais. Quem sabe no oriente poderia chamar-se de "Trans-Bokator", numa referência ao Trânsito com a Bokator, uma arte Marcial das mais letais da história que nasceu no Camboja há mais de 10 mil anos e parecido com a Muai Thai Boran da Tailândia. Uma luta desigual que levou a morte mais de 2 milhões de mestres e alunos, segundo a história.
Já comentei em algumas publicações anteriores a criação de um filme nos anos 50 pela Disney do personagem Pateta que no desenho animado muito bem idealizado, retratava a realidade da agressividade no trânsito pela transformação da personalidade do Pateta ao dirigir. Na vida em casa, com família e vizinhos, um ilustre e pacato cidadão. Ao volante de seu carrão conversível amarelo, o Pateta transforma-se num alucinado agressivo com ações violentas, egoístas e ameaçadoras na disputa pelo espaço que no entendimento dele pertencia somente a ele.
Mesmo rindo muito pela obra bem elaborada e criativa de Walt Disney, é triste de entender que essa narrativa não foi uma criação subjetiva. Foi inspirada na cenário real do comportamento social Norte Americano e logicamente espalhado pelo mundo, incluindo o Brasil.
Interagir no trânsito requer extrema capacidade de aceitação pelas diferenças. As diversidades são amplas e até mesmo no tipo de veículo ou na condição de pedestres, é indispensável que se contenham os sentimentos de disputa, de intolerância e prevalência indevida sobre os demais.
A criação dos automóveis mudou o modo como as pessoas se movimentam mas não mudou os comportamentos sociais que perduram há séculos, infelizmente com muito a melhorar em muitos perfis do caráter individual.
3 - Fatores humanos e tendências aos acidentes
A influência comportamental pode levar a um acidente quando for indevida e para a prevenção quando comedida, em harmonia com as interações sociais em respeito às Leis e à Vida.
Conforme Rozestraten, em seu livro "Psicologia do Trânsito" Editora da USP 2015, pág. 95 e 96 os acidentes de trânsito não possuem uma única causa, mas um conjunto de fatores e após as análises, elencou-se as causas através de uma pesquisa no Reino Unido com registro de 2.068 fatores. Veja o quadro parcial abaixo.
Isso demonstrou que os fatores causadores de problemas pessoais afetaram a capacidade cognitiva e de julgamento, além da inobservância das regras como limite de velocidade e distrações aliadas à falta de habilidade levaram a dois terços das causas de acidentes no total pesquisado pouco mais de dois mil casos.
Existem muitas obras literárias que abordam o tema da violência e agressividade ao volante, infelizmente uma fatia da violência e criminalidade global que afetam não apenas a questão da mobilidade, mas o comportamento social em amplitude total.
Basta assistir à uma edição dos noticiários de telejornais que as manchetes parecem se repetir trocando apenas os autores em crimes de homicídios, assaltos, roubos, atropelamentos criminosos, acidentes por imprudências, quadrilhas organizadas para ações criminosas e nesse esteira os comportamentos agressivos num simples ato de dirigir que perdem a notação pela comparação aos mais graves ainda. Um retrato social que exige mudanças a partir da formação educacional de base.
Quando um motorista ou motociclista usa seu veículo para demonstrar sua fúria com manobras de altos riscos, expõe não apenas as pretensas habilidade, mas sua insanidade e despreparo para o convívio social. Os próprios eventos de rachas são estimulados pela plateia que a rigor deveriam denunciar e não estimular os infratores criminosos.
Quem já assistiu aos filmes da Roma antiga pôde observar no Coliseu as cenas de gladiadores sanguinários em corridas de cavalos com espadas e lanças a se atacarem até a morte. O público grita enlouquecido pelo clamor e na ânsia de ver o sangue do perdedor verter. Troque a arena do Coliseu pelas vias públicas e os cavalos por possantes automóveis modificados ilegalmente, os atuais gladiadores são uma quantidade de pessoas criminosas e levados pelo calor de uma multidão também insanas a prestigiar esses feitos.
4 - Mobilidade das Pessoas
As atuais regiões metropolitanas do Brasil e no Mundo transformaram-se num gigantesco emaranhado de vias e edificações que atraem multidões indo e vindo em turnos alternados pelo trabalho, educação ou lazer. Seria tranquila essa mobilidade não fossem as consequências do adensamento populacional, seja permanente ou sazonal.
E onde entra a Psicologia no Trânsito nesse quesito? Eu não conseguia entender essa ligação até observar as brilhantes citações dos principais articulistas quanto aos efeitos psicológicos causados aos atores no trânsito, sejam condutores ou pedestres, passageiros de coletivos, trens e metrôs.
A pressão pelo cumprimento de horários, disputa pelo espaço, tanto de vagas para estacionar como de locomoção e pasmem, até mesmo onde colocar os pés num trem ou ônibus superlotado, levam uma grande parcela da população ao extremo de resistência emocional e baixa qualidade de vida. Isso tudo causa um abalo na capacidade de absorver as provocações que nem sempre possuem teor de ataque, mas sim consequentes dos aglomerados, do sistema urbano como um todo e não refletindo pelas causas em sim, "abrem as caixas de ferramentas do mal" agredindo uns aos outros de forma gratuita e que em muitos casos chegam às lesões corporais e homicídios.
Esse aspecto na Psicologia no Trânsito é um dos mais desafiantes para um leigo nessa área em arriscar definir qualquer linha de raciocínio. Resta ler muito e estudar o que dizem as principais autoridades na psicologia e na psiquiatria para então obter um resumo básico.
Alcançar um estágio de qualidade de vida mais digna, menos estresse, maior respeito pelos cidadãos, uma Gestão Pública que efetivamente agisse em prol de um Plano Diretor das cidades visando equilibrar o adensamento e promoção da fluidez no tráfego seria um bom começo para modificar as causas raiz de tanta agressividade no trânsito. As poucas exceções restantes seriam mais facilmente resolvidas pelos bons resultados obtidos.
Obrigado pela leitura!
Thyrso Guilarducci
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